11.5.12

A poesia é risco: em defesa de Leminski


Por Bruna Piccazio

Tudo que há de Paulo Leminski me interessa. Principalmente seus poemas. E me chamou a atenção o fato de um livro dele, Catatau, estar inserido na programação da Casa das Rosas, durante a Virada Cultural.  Saber que ele seria lido na integra, durante algumas horas,me causou inquietação.

Às vezes, dentro de um poema inteiro de Leminski, uma ou duas palavras saltam do texto, libertam-se do conteúdo poético abordado e tornam- se significativas para mim. Estas poucas palavras realmente são transferíveis para os conteúdos de minha própria existência e reflexão.
Assim penso a leitura de um livro seu, usufruído lentamente, da maneira como algumas expressões e frases são organizadas por ele.

Fui até a Casa das Rosas, quis saber o que se passava e, por isso, fiz a seguinte pergunta a Frederico Barbosa, o diretor do Espaço e organizador do evento: "Fred, você  acha que todo mundo vai ficar  aqui sentado do lado de fora da Casa, das 22h da noite até as 10h da manhã ouvindo a leitura integral do livro?"

Ele que, também, e antes de mais nada, é um consagrado poeta,  deu risada, e disse que o Catatau é um livro especial e bem poético.  Disse ainda que não esperava mesmo que alguém ficasse do começo até o final. Imaginei, então, que, o propósito fosse proporcionar pequenos momentos de fruição para quem lá resolvesse assentar o traseiro.

A leitura feita por três jovens em microfones, vomitava o livro todo, sem parar. O que restava então era relaxar, e pescar algum  enredo. Na mesa dos leitores, café, guaraná e vinho.
Resolvi me entregar, pesquei os micro enredos que me importavam e viajei nas portas que se abriam para minha imaginação.

Na programação, o show do  compositor e produtor musical Cid Campos, filho do grande poeta Augusto de Campos, e sua banda. Segundo a descrição do evento: “A poesia concreta comparece com destaque através da musicalização e/ou oralização de poemas de Augusto e Haroldo de Campos, José Grunewald e Ronaldo Azeredo”.

De fato, percebemos, ao longo do show, a convivência harmoniosa entre letra e melodia em que ambas não ficam juntas a música inteira, uma cede à outra de vez em quando, criando-se, assim, uma impressão de espaço de declamação. Parece, até, que a poesia entra para descansar os músicos da porrada na bateria ou para descansar os ouvidos de todos da quantidade de notas musicais arranjadas para as músicas. Porém, a banda não perde o ritmo, seja dentro da melodia, ou  na cadência das palavras.

O trabalho do quarteto lembra muito as músicas de Tom Zé que têm essa relação com a poesia. Aliás, Cid Campos também trabalhou com Tom Zé, e, entre outros: Adriana Calcanhoto, Walter Franco, Péricles Cavalcanti.


Os passantes da Casa das Rosas e o público sentado nas cadeiras, dentre eles, crianças e velhos, ouviam de Cid Campos,de repente:  “estuprou o meu hímem” e muitas outras sinceridades poéticas dos grandes poetas.Que,aliás, deveriam ser consideradas palavras e conteúdos normais e usualmente abordados. Mas, não. Infelizmente.

A irreverência dos músicos é, na verdade, a irreverência da poesia e de suas críticas e denúncias. O que faz Cid Campos é dar voz à poesia, através da música, que, das artes, é uma das menos periféricas e uma das mais consumidas.

A apresentação foi um sucesso, na medida em que a poesia aflorou através da oralização e conexão de sons com palavras. O mais impactante e significativo que havia ali eram as palavras. O show foi feito a partir dos três Cds de Cid Campos: Poesia é Risco, No Lago do Olho e Fala da Palavra. O músico participou, também, dos grupos: Papa Poluição, Sexo dos Anjos, Zipertensão. 


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