Os 2 Josés
Andava pelos corredores escuros do Sesc Pinheiros, mas não o encontrava. Era uma noite estranha de agosto quando, de repente, as luzes se apagam. Tento achar algum interruptor, alguém que possa me ajudar, mas nada. A escuridão é completa. Começo a perceber passos e corro na direção contrária. Cada vez mais rápido, mais rápido.
Saio, de súbito, no pouco iluminado palco do teatro do Sesc, e não há ninguém lá, até que ouço uma música sóbria que me faz pular de susto. Subo meu olhar para uma plataforma e vejo pessoas conversando. São eles!, penso. Depois de muito procurar, eu consigo vencer meus medos e chegar até o local onde estava Zé do Caixão.
José Mojica Marins não tem absolutamente nada a ver com seu personagem, Zé do Caixão. Senhor pacato, caminha de forma tranqüila enquanto pita seu cigarro. Não fosse pelas unhas, ninguém na rua saberia dizer que ele é e foi uma das personagens mais importantes do cinema brasileiro. Único, até os dias de hoje, a fazer filmes de terror.
Desço com o diretor/roterista/ator e sua noiva até o camarim para podermos conversar tranqüilamente. Aos poucos, ele explica como eram as coisas em seu início de carreira. Teve inúmeros filmes podados pela ditadura militar e outros cuja circulação foi proibida. Uma das instituições que mais o censurou foi a igreja: “os padres me odiavam”. Segundo Zé, ele chegou a ser preso e a sofrer torturas psicológicas.
A grande felicidade de Mojica neste momento é a gravação de um filme que deveria ter sido rodado em 1976, mas que foi caçado pela ditadura. Graças à ajuda de dois jovens fãs, o cineasta conseguiu material e patrocínio para realizar Encarnação do Demônio, último da trilogia (outros foram À Meia-Noite Levarei sua Alma e Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver). Ao falar do filme, ele parece uma criança: “e aí a mulher vai ser aberta ao meio...”.
Arte Free? Para ele é importante que a cidade ofereça o máximo de atividades artísticas gratuitas, pois arte é essencial na educação das pessoas.
A apresentação desta quinta-feira no Sesc Pinheiros foi uma contação de histórias de medo. Entrou em cena Zé do Caixão, e as cerca de cinqüenta pessoas presentes puderam ter, em menos de uma hora, um pouco do que foi e é José Mojica Marins.
Imagine-se ao pé de uma fogueira em um acampamento a milhas e milhas de qualquer lugar. Nesta fogueira, uma das crianças pega uma lanterna e começa a contar histórias que farão com que as crianças menores não consigam dormir naquela noite, de tanto medo.
Zé do Caixão leu dois contos, falou um pouco sobre sua história e até fez críticas muito bem colocadas. Disse que, com tanta coisa acontecendo na cidade de São Paulo ultimamente, nem precisaria agosto ser o “mês do cachorro louco”.
- Quando cai um ônibus e as pessoas morrem, todos os outros na estrada querem parar para ver. Agora, se os mortos deste ônibus forem pessoas das famílias dos que estão lá só olhando, eles ficam preocupados, começam a telefonar, a chorar. Afinal, nós somos todos irmãos. Isso tem que parar!
Custos
Ônibus – R$ 2,00 (ida e volta no bilhete único)
Cafezinho – R$ 0,90
Total – R$ 2,90
Nota - 8
3 comentários:
Adorei a matéria. Mas, sinceramente, não iria ver Zé do Caixão contar histórias de terror...Tenho medo!Rs!
muito bom menino !!
Texto enxuto, bem conduzido, personagem explorado na medida certa. Parabéns.
Luc Limas
Postar um comentário