29.9.06

Canil - ECA - 29/09/07

Farra no Canil

A cervejada da ECA – Escola de Comunicação e Artes da USP – estava lotada. De um lado, manifestações estudantis – um cara que falava ao microfone –, de outro, uma fogueira, cheia de gente em volta.

De repente, alguns músicos apareceram perto da fogueira e, tocando, convidaram aquelas pessoas para assistir sua apresentação. Foram atendidos, e todos entraram no “Canil”. Canil é onde as bandas tocam, um lugar que parece uma banheira. É como um buraco no chão, o que ajuda, e muito, sua acústica.

Logo o Canil estava lotado, e aí aconteceu algo espontâneo: um cara, do nada, resolveu fazer uma apresentação, encenar enquanto a banda tocava. Felipe (fig.1), o vocal da banda, que entre outras coisas é animador de navios, embarcou nessa viagem. Eles dançavam, fingiam ataques epiléticos, faziam mímicas, como a de um puxar o outro com uma corda, ou então um inflar o outro. Num determinado momento simularam uma briga em câmera lenta, foi sensacional! Era tudo espontâneo, tudo improvisado. Muita sintonia.

O esquema da ECA é o seguinte: toca quem quer. Apesar disso, a base da banda, bateria e baixo, permaneceu mais ou menos inalterada. Por causa dessa troca de músicos, principalmente de vocalistas, deu para ouvir muitas sonoridades diferentes. Havia samba, funk/soul, Raul Seixas, Chico Buarque, maracatu, rock, forró. Esse último estilo foi o convite perfeito para que todo o Canil dançasse. E dançaram, dançaram muito.

Além de Felipe e do doidão que virou seu parceiro cênico, havia uma menina que também atraia atenção do público. A garota brincava com um jabolô – brinquedo feito por um pedaço de barbante amarrado a dois tocos de madeira, no qual se equilibra um objeto semelhante a uma ampulheta.

Juntou-se a eles um imitador. Com voz idêntica a do Sílvio Santos, cantou clássicos de Chico Buarque. A platéia inteira rolou de rir.

Muitos instrumentos eram alternativos. Havia um saxofone de bambu, um apitinho que lembrava uma corneta, instrumentos percussivos feitos de materiais diferentes.

A apresentação começou dez da noite. Às duas da manhã ainda havia gente animada tocando. Poucas pessoas assistindo, é verdade, mas ainda sim o som continuava solto.

Reportagem e fotos – Gaia Gonçalves
Texto – Luciano Piccazio Ornelas


Nota - 9

Custos:
Comes e bebes - R$ 10,00
Transporte – Carona ida e volta
Total – R$ 10,00

28.9.06

Edgar Scandurra – Fnac Paulista – 27/09/06

Sonoridade Incondicional

Quase não deu tempo. Sorte que Edgar Scandurra desceu na estação errada e também se atrasou. Na platéia de cem pessoas, muitos fãs do Ira!, que pareciam não saber ao certo o que esperar do projeto solo “Amor Incondicional” de Scandurra, guitarrista do Ira!, sendo lançado ali na Fnac.

Edgar caminha entre o público até chegar no palco, junto com a baixista e também vocalista Sandra Coutinho e a baterista Michele Abú. 19:30 e o show começa. A primeira faixa, que dá nome ao disco, já anuncia o que se verá durante toda a apresentação: uma mistura de pop rock com batidas eletrônicas. A platéia não se anima muito no começo; ficam observando como quem não sabe a letra ou ouve a música pela primeira vez. E esse era realmente o caso.

O show segue com músicas ora mais “viajantes”, lembrando um pouco o rock psicodélico do Pink Floyd, ora mais dançantes, que animavam mais o público. Nas músicas de Scandurra, as coisas mais importantes são o ritmo, os solos, os instrumentos. As letras parecem ficar em segundo plano (são um tanto quando repetitivas) - os sons das palavras servem mais para criam um ritmo, dialogando com os outros instrumentos no palco, do que para transmitir alguma mensagem ou poder ser pensada como poesia.

Scandurra, sempre transitando entre a música eletrônica e o rock, comanda não apenas a guitarra como também os “botõezinhos” que controlam as batidas eletrônicas. O som nem de longe lembra o da banda Ira! - fato que talvez tenha frustrado a expectativa de alguns. Mesmo assim, ao decorrer da apresentação, o público foi se tornando mais íntimo do som – talvez surpreendente e inesperado – de Edgar Scandurra; ao final do show, todos já estavam dançando e balançando a cabeça.

O show terminou as 20:30, pontualmente. O público pedia mais: o show terminou e eles continuavam lá, em peso, olhando para Scandurra em silêncio, como quem pede bis. Mas ele logo avisa “é um pocket-show”, e parte para os autógrafos e fotos com os fãs.


Set List: Amor Incondicional – After Silence – Do Chão Não Passa – Decadanse – Ofake – Frio – Patchouli – S.A.O. Til – A Virada – Copan – Trashland – Tetela – Barulhinho.

Custos : 2 reais (ônibus para ir e voltar)

Nota: 7

26.9.06

Acervo permanente - MAC - 26/09/06

As crianças cor-de-laranja

Confesso que já fui várias vezes neste museu. O MAC – Museu de Arte Contemporânea – fica dentro da USP, e, como aluno, sempre passo na frente. Por vezes entro.

Desta vez, uma excursão de treze pequenos alunos visitava o local, e três adultos os acompanhavam. Elas vestiam roupas cor-de-laranja, e olhavam com um misto de espanto e curiosidade para Volpi, Tarsila do Amaral e Cia.

O museu é um pequeno aperitivo artístico. Apenas um ou dois quadros de cada autor de renome, tais como Tarsila do Amaral, Picasso, Marc Chagal e outros. Senti falta de mais obras de alguns autores, como Di Cavalcanti (há somente um).

Apesar disso, há uma criteriosa escolha das obras: são preferencialmente das décadas de 20 e 30, com cores foscas e cenários específicos, como bares e marinas. Obviamente não falamos aqui dos quadros abstratos, também em bom número.

Um dos mais impressionantes quadros é de Ottone Rosai, chamado Estalagem (fig.2). Mostra quatro homens num bar, e logo temos a impressão de sermos testemunhas de uma conversa informal entre mafiosos italianos. Os traços não são bem definidos, e dão uma sensação de ilusão, sonho; fazem com que esta imagem fique na cabeça e dê lugar a mil interpretações diferentes. O bar mafioso é apenas uma delas.

Outra obra nesse estilo é Os Emigrantes, de Mário Sironi (fig.1). Exibe uma cena da emigração nordestina para o Sudeste brasileiro; uma família vindo em tristeza absoluta, cujo um dos integrantes monta um cavalo igualmente triste. Aqui as cores também são foscas, cor-de-terra.

Difere destes traços impressionistas o quadro de Gianfilippo Usellini, O Cardeal (fig. 3). Com traços definidos, mostra um cardeal com roupa de um vermelho forte, cujo longo véu de sua capa é carregado por dois coroinhas. A primeira sensação é de estranhamento, já que estão em um corredor enorme, que os faz pequenos. Mas, se seguirmos o olhar do clérigo e de seus ajudantes, vemos que miram um demônio que está na parte superior da tela. Algo que não observamos na primeira olhada.

O museu tem pequenas esculturas, como a de Vitor Brecheret (fez o Monumento às Bandeiras, que fica na frente do Parque do Ibirapuera). A mais interessante é, sem dúvida, a Você Faz Parte II, de Nelson Leirner. É uma obra cheia de chaves e fechaduras, e tem uma surpresa bem interessante.

Saí de lá e as crianças cor-de-laranja ainda ouviam seus professores, mas já tinham mudado de sala.

Custos
R$ 2,00 (ônibus ida e volta no bilhete único)

Nota – 9

(imagens retiradas do site do MAC)

25.9.06

Editorial - Áreas Vip´s em shows gratuitos?

Áreas Vip´s em shows gratuitos?

Quantas vezes já vimos em shows gratuitos áreas Vip´s enormes separando o palco do público? Áreas nas quais os convidados se sentam tranqüilamente para assistir ao show, independente do horário de chegada, enquanto o resto do público se mata para conseguir ao menos ver o artista. Parece estranho, mas mesmo em lugares teoricamente democráticos há segregações. Há aqueles que podem, e os que não podem.

Quem observa o dia-a-dia da cidade não pode nem ficar surpreso. Afinal, São Paulo muitas vezes parece ser um jogo social sem fim. Favores, concessões e interesses movem pessoas e empresas. Com a arte não é diferente.

O movimento negro tem vários lemas. Um deles é “os direitos iguais são menos iguais para nós”. Estão certíssimos, já que há gerações são massacrados e marginalizados da sociedade. Essa nossa sociedade, dita sem preconceitos.

Esta segregação vai radicalmente contra a idéia de democratização da arte. Mostra que alguns promotores ainda tratam a arte como mercadoria, e parecem desconhecer o seu verdadeiro significado. Tal fato fica muito claro na medida em que a atenção e o interesse por parte desses agentes concentra-se apenas nos patrocinadores. Nesses casos torna-se visível a total falta de compromisso com a arte, mantendo-se o foco apenas e tão somente nos lucros que ela pode gerar. .

É evidente que patrocínios são importantes, não é isso que está sendo discutido. Só que patrocinadores e patrocinados têm de estar cientes que a arte é social, que representa muito para as pessoas e que tem uma função ímpar, tanto de mobilização, de compreensão da vida, de divertimento, de lucidez e outros.

O Parque do Ibirapuera, para tentar resolver o impasse, baixou uma norma. Não haverá mais áreas cercadas em frente ao palco, que seja de acesso exclusivo de patrocinadores e convidados. Esse lugar será destinado aos idosos e pessoas com problemas físicos. Louvável gesto que tem de ser imitado. E fiscalizado.

Um exemplo clássico de segregacionismo se deu no Bourbon Street Fest. Lugar lotado, impossível para os claustrofóbicos de plantão. Enquanto cerca de quinze mil pessoas se amontoavam para tentar enxergar algumas das bandas de New Orleans, um imenso espaço separava o mais fiel espectador do palco. Dentro desse espaço, patrocinadores elegantemente sentados, crianças correndo de um lado para o outro, refrigerantes e cervejas passando nas mãos dos chamados Vips. Do lado de fora da área segregada, pessoas mal conseguiam respirar, se acotovelando por um lugarzinho. Um sol sem piedade queimando os miolos.

É imprescindível tentarmos mudar essa situação. Que ao menos nos conscientizemos de que isso é mais um fator que divide a nossa sociedade entre duas classes: a dos que podem e a dos que não podem. Lutar para que isso acabe, em vez de torcer para passarmos para o time dos que podem.

24.9.06

Klaus Mitteldorf e Regina Silveira - Pinacoteca do Estado - 23/09/06

Da Relação entre Arte e Sujeito

Uma sala da pinacoteca tingida de azul, em vários tons. No espaço ao lado, as fotografias intrigantes de Klaus Mitteldorf. Pessoas curiosas, estudantes, famílias e fotógrafos vagam pelos corredores da Pinacoteca sábado à tarde.

A responsável por criar o efeito azul na sala em forma de octógono da Pinacoteca é Regina Silveira, artista já consagrada por suas instalações e intervenções urbanas. Aqui ela instalou vidros formando o desenho de um céu azul com uma grande lua cheia no centro no teto da sala: conforme a luz passa, em suas diversas intensidades, colore a sala de um modo único e muito bonito. No chão dessa mesma sala há um tipo de poço, e, no fundo dele, a mesma imagem do teto. Vertigem.

A artista brinca com a luz e com o “observador”, que aqui não só observa, mas participa da obra de arte. Ele também é personagem do cenário criado por Regina. A aproximação da arte com as pessoas é o mais interessante em uma instalação. Desperta interesse, curiosidade e transforma o conceito que muitos tem a respeito do que é uma “obra de arte”.

A iluminação ultrapassa os limites da sala-octógono e chega até o espaço onde estão expostas as fotos de Klaus Mitteldorf, criando uma atmosfera onírica para as já surreais fotos do artista.

Utilizando-se de lentes, lupas, filtros, transparências, espelhos e água Klaus constrói imagens desfocadas, contrastadas, coloridas, que parecem até ter movimento próprio, mesmo dentro das molduras. Confesso que fiquei intrigada; demorei para entender a proposta de Klaus. Aquelas imagens de quem parece que não conseguiu focar são de propósito, visam enxergar a realidade de outros prismas, e pensar o próprio conceito de “realidade”. Será que o real não pode ser considerado como tal se não for focado e estático? As fotografias são a materialização dessa pergunta.

“Introvisão”, como é chamada a exposição, também quer enxergar a realidade através de outras óticas, literalmente: a ótica do sujeito fotografado; através de seus olhos, de seus óculos, das distorções próprias de cada um, de cada realidade particular. Os olhares individuais captados por Klaus brincam com a relação entre fotógrafo e objeto, transformando um pouco o fotografado em fotógrafo também.

Com essas duas exposições, a Pinacoteca criou um espaço muito interessante para a discussão da arte e sua relação com seus objetos, com o sujeito e com o público. Além disso, está lá a arte contemporânea exposta de forma bela, intrigante e gratuita. Vale a pena conferir.

Custos – R$ 5,95 (4,20 de metrô para ir e voltar + 1,75 por um sorvete).

Nota - 10

22.9.06

Qioguem?! – CCSP – 21/09/2006

Humor clássico, o humor de verdade

Fui desconfiado até o Centro Cultural. Afinal, assistir a uma comédia japonesa do século XIV, com o estranho nome de Qiogem?! não é garantia de diversão. Mas a curiosidade me motivou e a surpresa realmente foi gratificante. O público compareceu e tomou os 110 lugares da casa, e um humor sem apelações e nem bobagens gratuitas - tão raro nos tempos atuais - apresentou-se vivo no palco da sala Paulo Emílio.

Kyogen significa, literalmente, palavras insensatas. E essa insensatez, presentes em todas personagens, era a graça do espetáculo. A interpretação do elenco é de chamar atenção: o entrosamento entre eles ficou evidente e havia sempre muita sincronia nas coreografias. Aqueles pequenos erros, tão normais em todas peças teatrais, não apareceram dessa vez. Os figurinos e as maquiagens são originais, conservando a cultura japonesa com quimonos e penteados típicos do Oriente.

Os temas apresentados são diferentes entre si e não buscam qualquer profundidade. Fazer rir é o objetivo. Desde os mais complexos, como o desejo pelo suicídio, até um simples caso amoroso: todos são retratados, buscando as piadas mais oportunas. Essa falta de coesão entre as cenas causa um ligeiro estranhamento, mas como os esquetes são bem montados, quase não se percebe este ponto fraco.

Personagens típicos da realidade e da imaginação se misturam em um grande folclore criado na mente de quem assiste. Os recursos cênicos são utilizados com extrema pontualidade e inteligência, como máscaras engraçadas e ótimos ajustes de iluminação. Outro ponto fraco é o cenário: simples em excesso.

Um grande diferencial da obra é a trilha sonora. Em sua maior parte é feita ao vivo por Gregory Silvar com a ajuda dos próprios atores. Os instrumentos são simples: canos de PVC, pedaços de madeira, vasos com água, entre outros. A criatividade sobra quando se trata de concepção sonora, chama sempre a atenção do público e, em alguns casos, é a própria piada.

O que parecia significar estranheza e falta de sincronia com os tempos atuais acabou servindo de grande trampolim para risadas de verdade. O humor clássico japonês provou ser muito competente e até mesmo contemporâneo. A adaptação da Caos Cia. De Teatro também ficou muito fiel e digna. O tempo pode passar, mas o talento resiste aos anos.

Custos:
Transporte – R$ 4,20 (ida e volta de metrô)
Salgado e refrigerante – R$ 4,00
Total – R$ 8,20

Nota – 9

Por Allan Brito

21.9.06

Foto em Cena – Henri Cartier-Bresson

O Momento Decisivo
por Helô Louzada

Henri Cartier-Bresson. Não há como iniciar uma coluna sobre fotografia sem falar do fotógrafo que mais influenciou a produção moderna e contemporânea. De certo, a maioria dos leitores já teve oportunidade de entrar em contato com algumas das fotografias de Bresson. O instante exato em que o homem que está pulando sobre uma poça d’água e encosta a ponta de seu sapato na água ou o casal que se beija sob o olhar atento de um cachorro.

Para a construção dessas e de tantas outras imagens fantásticas, Cartier-Bresson parte do conceito do que ele chama de momento decisivo. Ao contrário do que possa se pensar, esse momento não é apenas um flagrante inusitado ou um instantâneo.

O momento decisivo é o instante que resume uma realidade ou um acontecimento, e que pode ser percebido através das diversas relações e entre as diferentes dimensões dessa própria realidade. Ou seja, é uma construção imagética que mostra essa realidade ou acontecimento.

Ao observar a foto do homem pulando na poça d’água (cujo nome é Atrás da Estação Saint-Lazare) pode-se enxergar a relação entre o homem e a bailarina no cartaz ao fundo, que estão praticamente na mesma pose; ou o rebatimento das formas do fundo na própria poça, a divisão da realidade em duas dimensões, etc. Essa fotografia é a perfeita explicação do que é o momento decisivo.

Outras fotografias do mestre Bresson ainda brincam com jogos de olhares que envolvem não só os personagens da cena, mas o olhar do próprio fotógrafo e do observador da imagem, como é o caso da foto do casal se beijando (Boulevard Diderot), entre outras.

Para Cartier-Bresson, o momento decisivo é a justificativa da fotografia, e o fotógrafo é o profissional que tem a sensibilidade para capturar e perceber esse instante. Essa definição influencia toda a produção fotojornalística desde os primórdios da revista norte-americana Life até a produção documental e engajada de Sebastião Salgado.

Há uma discussão em torno da veracidade ou não da espontaneidade desses momentos decisivos, ou se são ou não fotos posadas. O que se sabe é que havia sempre um estudo minucioso da imagem antes da captura do tal momento, “rascunhos” sobre os possíveis enquadramentos e longas esperas desse instante mágico e fugaz em que a realidade estaria explícita.

Se isso tira ou não a aura mágica do instante decisivo, é uma discussão menos relevante do que a revolução causada pelas fotos e o conceito lançado pela tendência humanista francesa, na qual Bresson se encaixa.

Henri Cartier-Bresson é, sem dúvidas, o grande mestre da fotografia moderna, sem o qual não há como pensar a produção contemporânea. Nas palavras do próprio fotógrafo: “Fotografar é colocar na mesma linha de mira a cabeça, o olho e o coração”. Que assim seja.


Helô Louzada é estudante de História. As quatro primeiras fotos são de Henri Cartier-Bresson. A última é um retrato do próprio fotógrafo.

ENTREVISTAS: FERNANDA PORTO

Fernanda Porto:Com meia hora de antecedência, chego ao estúdio de Fernanda Porto na Vila Madalena. Enquanto espero, a assistente de Fernanda, Nadir, faz as honras da casa. Apresenta-me a todo o estúdio, me oferece água e conta fábulas infantis.

Logo na sala de entrada do pequeno sobrado há uma estante de livros. Olho e vejo muitos e muitos livros de jazz, samba, maracatu, MPB... Nem cabem direito de tantos que são. Com permissão de Nadir, abro a outra parte da estante e vejo T.S.Eliot e Fernando Pessoa, entre outros.

Seguindo os passos de Nadir, vejo o pequeno armário que há embaixo da escada. Cerca de trinta caixas de instrumentos dos mais variados tipos. Há bags de saxofones, guitarras, instrumentos percussivos... Depois do armário, no final da casa, o local de ensaio - no momento em reformas.

No piso de cima, duas salas que servem como escritório, e uma terceira ,que Nadir define com “sala da bagunça”. Nela, centenas de cds bem organizados. Fernanda ouve Beatles, Jimi Hendrix, ouve Tom Jobim. Fernanda ouve tudo. Estar em seu estúdio é entender um pouco do porque desta grande mistura de sons e sonoridades que há em sua música.

Quando Fernanda chegou, tinha já um turbilhão de perguntas para fazer.

Nossa entrevista ocorreu em clima descontraído numa tarde de terça-feira. É mulher de sorriso largo, cujo conhecimento musical transparece no modo claro com que encara e descreve suas canções, no modo como se refere a Jobim e na forma que compara a música dos anos sessenta com o impressionismo.

Entrevista:

Qual a importância da arte gratuita?

Acho fundamental, não só para as pessoas, mas para o artista. É um termômetro pra ele conhecer o público que não necessariamente teria acesso aos shows normais, pagos. Às vezes é complicado, pois quando é de graça existe um descompromisso. O fã fala: “Ah, era isso?”, e vai embora no meio. Tem de tudo. Tem também aquele que não é tão fã, passou por ali e acabou ficando. Por isso que acho que é um exercício bem interessante de exposição em que você consegue perceber algumas coisas que em shows normais você não perceberia, de reação de público.

Fiz muitos shows em Casas de Cultura aqui em São Paulo. Fazíamos Campo Limpo, Freguesia do Ó e vários lugares da cidade em que não costuma chegar nada. Quando eu ia tocar numa praça pública dessas - lembrando que na época não tinha nem disco nem nada - todos acabavam assistindo. Mas também, se não gostassem, iam embora.

Um dos primeiros shows que eu fiz na vida foi na Praça São Bento do Metrô, que chamava “Quarta Musical do Itaú”, em 1989. Foi ótimo, e percebi quais as músicas que funcionavam, quais que não funcionavam. Acho que, a partir dali, tomei várias decisões em relação às músicas que poderia apresentar para o público. Foi um grande aprendizado.

Quais seus programas culturais prediletos em São Paulo?
Gosto de ir à livraria Belas-Artes, ficar fuçando. A Fnac, por exemplo, já resolve várias coisas da minha vida. Desde ver os cds, comprar alguma coisa, ficar folheando livro. Procurar principalmente poesia.

Também gosto de exposições, mas às vezes acabo não indo. Tenho uma irmã que é artista plástica, minha mãe é artista plástica, tenho muitos amigos da área e uma amiga que é curadora. Então, vira e mexe, quando ela me lembra, eu vou. Porque às vezes você acaba esquecendo, né? Mas eu gosto bastante. Ir ao MAM, Pinacoteca...

Você estourou na Europa antes de vir fazer sucesso no Brasil. O que de melhor você levou daqui para lá?
Eu levei uma certeza: queria fazer música brasileira. Uma paixão muito grande por canção brasileira, e acreditava que esse ritmo pelo qual me apaixonei, o drum´n bass, tinha uma possível convivência com a nossa música. Tanto é que fiz, na época, mais de vinte músicas baseadas nesse ritmo. Em 1998 já levei um cd demo pra lá (Inglaterra) e mostrei para várias pessoas. Trabalhava com trilhas sonoras antes de fazer show e sobreviver deles. Sempre fiz shows, mas como eu não tinha disco, fazia só o circuito cultural, e às vezes não dava para sobreviver. Então acabei construindo esse estúdio para poder fazer outras coisas, e etcetera.

Nessa história de ir pra lá, eu conheci um cara de publicidade. O conheci fazendo trilhas sonoras, e ele era amigo de infância do manager da Janet Jackson. Um dia foi me encontrar em Londres e falou: “me dá teu demo que eu vou levar pro cara (manager)”. Esse manager ouviu e falou: “nada a ver comigo, mas vou mandar para outra pessoa que acho que tem a ver, de uma gravadora independente”, e eu já pensei “ih, gravadora independente?”. Era o FatBoy Slim, que era da Skint Records, Norman Cook. E aí ele identificou, nesse cd demo, duas músicas que gostou, Eletricidade e Pensamento, e que estão no meu primeiro disco – a segunda em parceria com Arnaldo Antunes. Nesse momento percebi que o que eu estava fazendo ia ser possível, porque, se um cara da Inglaterra falou que era legal... Se o cara que é desse estilo aprovou, achei que poderia continuar.

E se não aprovasse, qual seria o rumo?
Ia usar a minha viagem para fazer outras coisas, a curiosidade que eu tinha com a cidade (Londres). Na verdade, quanto a parte turística na Inglaterra, já tinha feito o que eu queria. Então eu fiquei mais tempo lá pra fazer música mesmo. Se eu não tivesse feito, eu voltaria a fazer o que eu sempre fiz, né? Trilhas sonoras de filmes, dar aulas de canto.

Você ainda dá aulas de canto?
Ah, eu não consigo. Hoje mesmo uma aluna me ligou e eu fico “marca, desmarca, marca, desmarca”. É muito complicado, minha vida não tem lógica. Tem gente que fala assim: “não, mas você só toca fim de semana”. Mas tem que fazer um show no Chile segunda, às vezes tem Fnac na terça...

O que de melhor você trouxe da Inglaterra para cá?
Eu trouxe esse ritmo, objetivamente falando. Eu trouxe loopings de drum´n bass, que é um ritmo que, entre os eletrônicos, já foi considerado o jazz do eletrônico. Muitos acham isso, como David Bowie. O que acabou ficando mais popular são as versões do drum´n bass mais simplificadas. Mas existem discos, por exemplo, que me lembram até o Chick Corea, na fase do Return to Forever; uma fase bem interessante dele. As sonoridades de alguns discos de drum´n bass que cheguei a conhecer pareciam muito o Chick Corea, e tem muito músico de jazz tocando drum´n bass; mas isso já é um pouco mais underground, a gente não chega a conhecer.

Clarisse Lispector, quando perguntada sobre qual gênero literário em que se encaixavam seus escritos, declarou: “os gêneros não me pegam mais”. Você já viajou por vários estilos musicais diferentes, e vejo pessoas tentando te definir com inúmeros rótulos. Os gêneros ainda te pegam?
Na verdade, eu me considero ainda uma visitante dos gêneros. Eu acho que nunca cheguei a fazer um drum´n bass puro, como eu nunca fiz um samba puro, nem um funk puro. Quando componho, me sinto usando o ritmo como argumento para musicar aquela letra, e não necessariamente sou profunda conhecedora.

Você pega um exemplo bem clássico: Gilberto Gil. Ele faz reggae. Ele é um cara que conhece reggae pra caramba, e tem até um disco em homenagem ao Bob Marley, o Kaya N'Gan Daya. Eu sou uma pessoa que, apesar de ter pesquisado bastante sobre drum´n bass, não se considera uma conhecedora profunda. Eu não faço exatamente drum´n bass; faço canção brasileira com drum´n bass. Aí perguntam: “mas é sempre drum´n bass?”. Nem sempre; às vezes têm umas batidas que têm mais tendência ao reggae e outras coisas. É até um esforço meu chegar num ritmo mais absoluto, mas acho que já nos misturamos tanto - e a minha característica sempre foi por gostar de muita coisa - que acabei perdendo um pouco as fronteiras e não sabendo os limites das coisas. Então eu vou de um lado para outro.

Qual a importância de Tom Jobim na sua composição?
Sempre entendi que Tom Jobim era maravilhoso, mas sem profundidade. Isso foi até o momento em que eu resolvi estudar mesmo a obra dele, fazer uma análise harmônica - que seria como fazer uma análise sintática para o português; sujeito, predicado... Por quê é que Tom Jobim é considerado mundialmente um gênio? Porque ele é uma pessoa que pegou a harmonia no momento mais delicado dela, que é o impressionismo, e a levou a um nível que ninguém mais chegou.

Ele é quase um erudito. Na verdade ele passou o erudito. Tem um conhecimento, a música dele transparece um conhecimento que absorveu toda a época áurea em que a harmonia foi a mais sofisticada possível. Tanto é que alcançou um limite em que não tinha mais para onde ir, uma época em que as pessoas começaram a fazer músicas com ruídos, com não-sei-o-quê, ou dodecafônicas, que é uma outra linguagem. Aliás, é o momento da arte em que as pessoas comparam muito com artes plásticas, que é o impressionismo, e que tem todos os degradês, todas as nuances das cores...

Acho que o impressionismo tem essa característica também na música, de passar por semitons de uma forma muito complexa, muito difícil. Jobim tem essa grande capacidade, e chegou, dentro dessa música que a gente chama tonal - que é a música canção - num nível que ninguém chegou, nem os jazzistas. Se você pegar Herbie Hancock e outros, eles fazem coisas muito ricas, muito sofisticadas, mas em outra linha, o modalismo. Dentro da tonalidade, da canção, não.

A canção exige, no mínimo, algumas coerências para você conseguir cantar. Não pode ser algo tão aleatório. Uma canção é boa se for fluente, se ela for carregável monocordicamente. Quer dizer cantar, você sair daqui cantando. As músicas de Tom Jobim têm uma melodia naturalmente impressionante, só que são muito sofisticadas. É algo que você fala: “Nossa, como que uma coisa que parece tão simples pode ser tão complexa?”. Tanto é que a música Só tinha de ser com você é extremamente sofisticada, apesar de não parecer. Isso é, para mim, o extremo do gênio.

Ter entendido também racionalmente Tom Jobim faz com que eu saiba te responder isso melhor. Acho que ele é uma pessoa que levou a harmonia ao extremo. Depois de Tom Jobim nada aconteceu.

Como é seu processo de criação?
É como se fosse um estado de paixão por alguma coisa, na maioria das vezes. Se eu leio um texto de um poeta que eu adoro, por exemplo: ou naturalmente me vem uma melodia na cabeça ou então eu quero conviver com aquilo, interpretar, trazer pra perto de mim. Compor é uma forma de me aproximar dessa admiração.

A grande maioria, cerca de noventa por cento das músicas que fiz, são a partir da letra. As minhas letras têm a ver com algo que eu vivi. Às vezes saem meio que simultaneamente. Começo a compor uma letra e, na seqüência, já faço a melodia. Quando saem juntas é outra história. Como eu não me considero uma letrista, escrevo o que é muito necessário para mim; é outro processo. Diferente de quando eu componho para outra letra que não minha. O sentimento, então, é o de ter vontade de visitar a cabeça de outras pessoas, muito diferente de falar o que eu sinto. Aí entra a intérprete, que é a cantora que quer cantar outra coisa. Ela não quer cantar minha vida, ela quer cantar... Isso eu percebo muito quando eu estou gravando disco. Quando eu canto músicas minhas, letra e música minhas, canto uma vez, e “já tá bom”. Quando eu canto uma letra que não é minha, tenho que me apropriar daquilo. São coisas muito diferentes.

Você ainda pensa em fazer trilhas de cinema?
Sim, eu adoro fazer trilhas justamente porque é um convite à inspiração a outros mundos. Por exemplo: cada um dos cinco filmes que fiz me levaram para um tipo diferente de música. O Cabra-cega, mais recente (2005), é o mais parecido com o meu trabalho autoral, porque é um trabalho de canção, e a maioria das músicas são canções da década de setenta que foram repaginadas. São da época da ditadura.

Os outros filmes, quase todos, foram filmes históricos da década de 1890. Tem um deles que é futurista, o 1999, pro qual eu fiz aquela música lírica. É o oposto: é um filme que eu fiz em 1993 e que, além de compor a trilha, fiz a cantora da boate no Reveillon de 99. Pensei que tinha que compor algo diferente. Então fiz uma música lírica e eletrônica em latim. A música inclusive está no meu show.

Acabei fazendo shows em periferias em 93/94 e as pessoas gostavam da música. Falei “ah, vou carregar essa música comigo”. Vira e mexe eu ainda canto, está no meu show, está no meu primeiro disco. E é uma coisa que não tem muita explicação. Uma música lírica em latim – ninguém entende nada. Mas as pessoas, de todos os tipos, desde crianças, mendigos, senhores de idade, todo mundo vem falar: “ai que legal!”.

Há músicas que você não agüenta mais tocar?
Não. Quando eu estou muito cansada de tocar uma música - coisa de estado de espírito - eu não canto. A não ser que o público peça muito; aí é outra coisa. Quando o público pede, a música se justifica. Eu entendo assim. A necessidade da música se faz através do outro. Às vezes você não está a fim de cantar para você, mas se o outro quer ouvir, muda toda a relação.

Normalmente, quando eu vejo que não estou muito a fim, mudo o set list. Aliás, sou a rainha de mudar o set list na hora do show. Os músicos ficam loucos. Já fiz até promessa de não fazer mais isso. Eles perguntam: “Mas qual, que música é essa???”. Eu respondo: “mas essa eu achei que você já conhecia...”. “Ah, eu não conhecia!”, eles dizem. (risos)

Você se chama Maria Fernanda Dutra Clemente. De onde vem Porto?
Eu saí de casa com vinte e um anos de idade. Havia pego o papel principal numa ópera-rock e meu pai não me deixou fazer. Tinha ficado com isso meio engasgado. Quando fiz vinte e um, “pensando” que já tinha maioridade, saí de casa e fui morar numa pensão. E aí meu pai falou: “você vai sujar o nome da família com esse negócio de cantora”. Hoje ele adora. Então eu fiquei procurando um nome pra mim. Passei por muitos.

Por quais?
Passei, primeiro, por todos que o meu pai têm, pra ver se eu gostava de algum. Meu pai, como é português, tem vários sobrenomes que não estão no RG, mas que são dele. Então ele tem Guedes, tem Vasconcelos, Menezes. Quando ele chegou ao Brasil tinha o apelido de Beto Guedes (risos). Passei por um monte de sobrenomes, e vários nomes já existiam, como Fernanda Menezes. Não dá, né? Fernanda da Costa. Aí quando falei Porto, eu gostei. Achei que tinha a ver com o som, gostei do som.

Se queria um sobrenome português...
Não sei se eu queria português, mas eu gosto do significado do porto, de ser um porto seguro. Apesar de ser uma contradição hoje, porque nunca estou em lugar nenhum, mas eu sempre quis ser uma pessoa que desse para os outros essa sensação, de que estou ali, e não a de alguém que foge.

Pra onde você está caminhando, neste momento?
Sempre acabamos fazendo na vida o que são os desafios mais íntimos. Por exemplo: pra mim viajar sempre foi uma dificuldade. Nunca gostei de viajar, e hoje isso já está completamente absorvido. Sempre fui muito tímida, então me expor era algo muito difícil.

Um grande problema que tenho é o de às vezes não viver os momentos, não curtir. Se você está num show, é ali que você tem que ser feliz. Não tem que ficar pensando se o público está gostando, se não está gostando; ou qual a próxima música que vai chegar – senão fica uma coisa muito racional durante o show. Venho aprendendo pelo menos isso: ser o mais inteira possível em cada lugar que eu estiver, e isso é algo muito pessoal. É um exercício para mim; não sei se vou conseguir chegar, mas percebo que tenho melhorado.

É ótimo assistir ao meu DVD e perceber que estava feliz naquele momento. Não estava pensando “Ai, será que está ficando bom?”, “Ah, porque o outro não-sei-o-que”. É assim: viver. Não ficar racionalizando nada na hora que você está lá.

Quando eu componho, sou completamente inteira. Eu só sei compor em estado de muita inspiração. Mas às vezes no palco, ou mesmo quando toco muito, acabo criando umas defesas, como observar o público, pensar outras coisas. Saio de um show feliz quando eu sei que vivi cada letra o mais verdadeiramente possível na interpretação. É onde eu gostaria de chegar.

20.9.06

Arnaldo Antunes - Fnac Pinheiros - 19/09/06

"Qualquer pra quem quer!"

Andam dizendo que Arnaldo envelheceu. Que já não grita mais. Perdeu o tom de protesto. Caiu em voz e violão. E até mesmo desarrepiou os cabelos. Preciso confessar que, como fã, fiquei receosa.

Uma fila imensa na Fnac Pinheiros. Mesmo sabendo que todos os ingressos já tinham sido entregues, as pessoas permaneciam por ali, na esperança de conseguir ver de perto Arnaldo Antunes - ou ao menos ouví-lo.

SOBRE O SOM
Na primeira meia hora do “pocket show”, o redator-chefe da Revista Bravo, Ricardo Lombardi, entrevistou o cantor. Questionado sobre a ausência de seus gritos peculiares neste novo cd que está lançando, “Qualquer”, Arnaldo falou sobre a rotulação que a mídia faz dos artistas. “A gente tá mais pra confundir do que pra explicar”, disse rindo. Seu novo cd é o mais distante do rock, e Antunes diz respeitar sua necessidade de expressão artística. Há treze anos, desde que iniciou carreira solo, o cantor e compositor vem buscando novas formas de expressão.

Falou um pouco sobre a gravação de “Acabou Chorare” e sobre sua admiração pelos Novos Baianos e João Gilberto; também falou das parcerias antigas e recentes e sobre seu processo de criação.

O repórter perguntou sobre a produção de livros, e se existe uma competição entre as duas formas de arte. “Mais do que competir, elas se completam, preenchem espaços vazios” afirma. Diz que está se adequando a uma época em que existe esse trânsito de criações. E, para finalizar, é questionado sobre a atual democratização dos meios de produção artística. Arnaldo considera a Internet um veículo democrático mas não sabe exatamente como essas novas tecnologias vão funcionar junto aos meio convencionais. “Ainda estamos na pré-história de uma coisa que está nascendo”, conclui.

Palmas e gritos: é hora de vê-lo cantar!

E SOBE O SOM
Antes de começar, Arnaldo lembra que a apresentação só teria trinta minutos e que, portanto, havia escolhido dez canções do novo cd, mas que logo estariam fazendo outros shows e os fãs teriam a oportunidade de ouvir as músicas antigas. As parcerias com Cezar Mendes, Chico Salem e Dadi Carvalho resultam em um entrosamento profissional. No palco os artistas trocavam olhares, sorrisos e pequenos comentários. Todos muito profissionais e ao mesmo tempo à vontade, dando um clima informal ao show. Arnaldo Antunes misturou em seu som as cordas dos violões, o piano e teclado e até mesmo uma acordeom, e ficou claro o quanto amadureceu musicalmente - como ele próprio havia dito. O resultado que assistimos nesse show comprova a apuração musical do artista, embalada pelo tom grave de sua voz facilmente reconhecível.

O público, durante todo a apresentação, intercalou as palmas efusivas - ao final de cada canção - com o silêncio - na maior parte da apresentação. Os músicos se despediram e deixaram o palco vazio. Foi o momento em que todos pediam “bis” e aguardavam o retorno dos quatro músicos ao palco. Arnaldo e a banda não só retornaram como fizeram o gosto da galera: tocaram mais três músicas, todas de repertórios antigos. Não teve como ficar parado e o coro foi uníssono e emocionante. “Não dá vontade de ir embora”, afirmou o cantor. E quando todos começaram a gritar nomes de canções que gostariam de ouvir, Antunes riu e fez com as mãos um gesto de “calma”. Nada melhor do que fechar o show ao som de “Judiaria”, com direito a ver Arnaldo saindo do palco e indo em direção ao público.

Mais uma fila se formava, agora para pegar o autógrafo e tirar fotos com Arnaldo Antunes. Todos aguardavam com seus cd´s e caderninhos na mão, e um sorriso que confessava: estavam satisfeitos com o show.

Ah, se todos envelhecessem assim...

Custos
Transporte – R$ 1,00 (ônibus com bilhete de estudante, na ida. Volta de carona)
Total – R$1,00

Nota - 10


Set List
Qualquer - Sem Você - Hotel - Dois Perdidos - Acabou Chorare - Para Lá - Lua Vermelha - Num dia - Contato Imediato - As Coisas
Bônus – Fim do Dia - Socorro - Judiaria

18.9.06

Laura Finocchiaro - Sesc Consolação - 18/09/06

Laura é Rock´n Roll

Uma menina vestida de rock – jaqueta jeans e cabelo curto pintado de vermelho – sobe ao palco de um lotado Sesc Consolação e faz o sinal da cruz. Batuca em seu corpo e a primeira música que ouvimos, acapela mesmo, é Oração.

Os outros três músicos, que haviam subido no palco com ela, começaram a tocar na metade da primeira música, e o chão fez sentir. O baixo de Pixinga deu àquela música e às seguintes uma força extra ao que estamos acostumados a ouvir de baixistas normais. Comprovou-se hoje, mais uma vez, que ele é um dos melhores do país.

Laura Finocchiaro é rock´n roll. Tem pegada de rock, tem jeito de rock e discursa como rock. Apesar disso, trafega sem problemas pelo mundo da bossa; e suas músicas têm estruturas e melodias de pops. Ela se define com Bossa Pop´n Roll.

Pixinga não parava de sorrir, assim como Laura. Pareciam felizes, e isso era transmitido ao público. Ao meu lado dois adolescentes de camisetas pretas com estampas de bandas vibravam aos solos de Pixinga e com partes das letras das músicas. Sorriam também, um para o outro, quando algo de positivo lhes chamava a atenção.

Uma música em homenagem à São Paulo: “Liberdade”. Bossa gostosa dessa italiana que foi adotada por São Paulo há vinte e três anos.

Tocou depois uma música que levantou a senhoras de plantão: “Menina Linda”, uma releitura do sucesso da Jovem Guarda que tinha Pixinga improvisando adoidado. Foi unanimidade, e todos na platéia cantavam e sorriam.

Na penúltima música, Laura ficou de lado e deixou a banda falar. Enquanto o baterista colocava o sampler de puts-puts para rodar e tocava bongô, e o tecladista dava o clima com sons viajantes, Pixinga voava. Depois, Laura voltou ao microfone e cantou “Com vontade de beijar”.

A cantora se comunicava constantemente com a banda através de gestos e olhares. Dava pra ver que não haviam ensaiado muitas vezes e ainda estavam se entrosando quanto à entradas e finalizações de músicas. No som, porém, nada pode ser notado quanto à isso. Exceto em um ou dois momentos, foram impecáveis.

Uma hora depois do início, o fim. Laura se despede e todos a aplaudem de pé.

Custos
Transporte – R$ 2,00 (ônibus ida e volta no bilhete único)
Cafezinho – R$ 0,70
Total – R$ 2,70

Nota – 9

Banda
Laura Finocchiaro – Vocal, guitarra e violão
Pixinga – Baixo
Tato Andreatta – Teclados
Mauro Sanches – Bateria e samples

Set List – 1.Oração – 2.Oi – 3.Frases – 4.Passos – 5.Link – 6.Tristeza do Jeca – 7.Duelo – 8.A ciranda rodava – 9.Love me leve – 10.Liberdade – 11.Vênus – 12.Menina Linda – 13.Com vontade de beijar – 14.Zen Zin Zoazou

(Fotos extraídas do site da cantora)

17.9.06

Causos - A atriz virgem

A atriz virgem
por Carolina Bataier

Martinha, como era conhecida por essas bandas, de repente cismou que queira fazer teatro. Mas os tempos eram outros. Anos 80. E Martinha, moça simples do interior, dessas que vão à missa todo domingo acompanhada dos pais. Dessas que não sabiam o que era decote ou mini-saia. Moça pra casar, como dizem por aqui.

Chorou. Bateu o pé, até que papai deixou. Então a mocinha juntou-se ao grupo de teatro da cidade. Desses simples também, sem dinheiro. Funcionava à base de paixão. Começaram os ensaios. A peça, “O homem do princípio ao fim”, do Millôr. Martinha estava ansiosa. E qual não foi sua euforia ao receber o papel de Molly. Ah! Mas que falas lindas. Uma mulher forte!

Martinha, cada vez mais empenhada em sua personagem. E cada vez mais inspirada em dizer os tantos “sins” que saiam da boca de Molly. Depois de seis meses de ensaio, Martinha pergunta para o diretor: “afinal, quem é Molly?”. Então veio a revelação: Molly era, na verdade, uma prostituta! E aqueles “sins” que ela gritava eram expressão de sua abertura, sua entrega, seu exagero. Martinha enrubesceu e declarou calmamente, no seu tom interiorano: “Ah nããão! Esse papel eu não faço de jeito nenhum. Papai e mamãe vão estar na platéia... Papai me põe pra fora de casa!”.

O diretor, paciente, tenta convencer a menina, dizendo que ela pode abrandar as falas. Talvez o pai nem note quem realmente é Molly!

E é o que a moça faz. Corta aqui, corta ali e não sobrou “sim” nenhum. Acabou-se todo o entusiasmo de Molly e ela por pouco não vira uma freira.

Passando para a segunda fase da peça, Martinha interpretaria uma virgem. Vai o diretor fazer sua parte: “Martinha, minha querida, faz uma virgem beeem virgem. Pensa na virgem mais virgem que você já viu!”.

Martinha enrubesce novamente, mas dessa vez perde sua calma e grita em alto e bom tom: “Mas eu sou virgem!”.

E no dia da apresentação, sobre o palco surgiram duas virgens: uma mais virgem que a outra.

Carolina Bataier é estudante de jornalismo

Lucina – Sesc Vila Mariana – 17/09/2006

Sozinha, pero bem acompanhada

Depois de vinte e cinco anos de sucesso fazendo dupla com Luli, Lucina decidiu seguir carreira solo. Em 1998, a talentosa cantora e compositora, amiga de Zélia Duncan (com quem já fez diversas parcerias), lançou seu primeiro CD solo. A consagração dessa jornada independente chegou em 2006 com a canção A música em mim.

E foi sozinha, apenas batucando alegremente seu atabaque, que ela cantou a primeira música “Timoneiro” no palco do SESC Vila Mariana nesse domingo. Mas, em seguida, a banda de apoio, com os três músicos, Paulinho Vieira (Baixo); Adriano Bosco (Sopro); e Marcos Paiva (Percussão) entrou e mostrou competência. Lindos solos de baixo, percussões muito bem colocadas e diversos sons de sopro diferentes davam um toque refinado e especial a cada canção. A banda era extremamente entrosada e experiente, complementando letras novas e antigas de Lucina.

O público, todo formado por adultos, não precisou aguardar muito tempo além do marcado. O show começou pontualmente às 13:30.

Curioso foi reparar o sorriso de Lucina enquanto cantava. A segurança e a experiência da cantora propiciaram um show alegre que conquistou a cumplicidade do público e permitiu diversas brincadeiras, conversas e piadas que deixaram o espetáculo bem leve. Era tudo o que todos poderiam querer numa tarde cinzenta.

Na metade do show ela arriscou cantar mais algumas músicas sem o acompanhamento da banda, apenas tocando atabaque ou apenas com seu violão. Muitas pessoas que saíam da praça de alimentação do SESC paravam para acompanhar e havia até quem arriscasse alguns passos de dança.

No final, bem que ela tentou se despedir, mas todos pediram sua volta duas vezes e ela não teve outra escolha: cantou mais duas músicas e demonstrou atenção com os fãs presentes. O tédio do domingo foi definitivamente expulso dos nossos corpos para dar lugar à prazerosa companhia de quem sabe o que faz no palco.

Custos:
Transporte – R$ 0,00 (fui e voltei a pé)
Chocolate – 1,00
Total – R$ 1,00

Nota – 9
Por Allan Brito

Quem Nunca – Sesi – 16/09/06

Eu Nunca! (Será?)

O frio não assustou. Espetáculo lotado. Os cinqüenta lugares seriam todos ocupados. A insistência dos que chegaram tarde demais.“Não, não tem mais nenhum ingresso, estão todos esgotados. Tem sido assim desde a estréia.”

A peça seria apresentada em uma sala do andar superior e, portanto, deveríamos aguardar, naquela sala de vidro, até que fôssemos liberados para subir de elevador em três ou quatro grupos de pessoas. A fila, formada por jovens e adultos, folheava os panfletos com a divulgação da peça que assistiríamos dali alguns minutos.

Entramos. O espaço era um longo corredor, forrado de tapete vermelho. Diferente do que se possa imaginar, quem ficava no meio éramos nós, o público, devidamente sentados em banquinhos fixados no chão. Os atores? Estes ficavam próximos às paredes, andando por todo espaço. E, por isso, podíamos nos esticar, agachar, girar...o dinamismo corporal não ficava só por conta dos artistas.

“Ética, ética, ética...ética?”. O menino que rouba o “pirocóptero”. A menina que leva o namorado, escondido, pra ficarem no quarto. A vizinha velha e doente que será visitada amanhã. Os queijos de cabra. O assalto na joalheria. As mentiras e os riscos no braço. O esquema do relógio de quarenta conto. A mulher que acordou honesta. O dinheiro ressarcido no banco. O convite no restaurante do hotel. O vaso de decoração. O cara infiel mas leal. O caso com o chefe. A empregada e os biscoitos. As bitucas. Parece um índice, não é? A diferença é que essas pequenas histórias não são independentes umas das outras e tão pouco falam dos mesmos personagens. São ligadas, principalmente, pelo tema: a ética. Mas o fio condutor dessas esquetes são as coreografias, o jogo de luzes precisas, o posicionamento específico dos atores, as músicas e o canto.

Ética é uma “idéia muito complexa pela própria extensão e profundidade do tema”, como afirma a diretora, Renata Melo, na introdução do folheto de divulgação da peça. Mas o grupo foge das grandes questões de ordem pública, política e institucionais para se focar no cotidiano, em situações que geram proximidade com a rotina, as escolhas e, também, os segredos da platéia. E conseguem essa identificação - comprovada pelas risadas, comentários e troca de olhares entre o público. Ainda que houvesse alguém isento de identificação com as situações interpretadas, essa pessoa não escaparia do paredão que os atores formaram na finalização do espetáculo: de forma alternada e iniciando a pergunta sempre por “Quem nunca...” eles questionaram uma sucessão de pequenos desvios éticos que comumente cometemos.

Aplaudidos de pé. O público ri e repete as falas. Alguns confessam, outros negam. “Eu Nunca!”. Será?

Custos:
Transporte - R$ 0,00 (Ida e Volta de carona)
Total - R$ 0,00

Nota - 9,0

Grupo:
Direção e Adaptação - Renata Melo
Texto - Grupo Ethos
Elenco - Apoena Gurgel, Bia Borin, Bruno Guilda, Carlos Gomes, Carol Lima, Dinah Feldman, Íris Yazbek, João Lorenzo, Leo Abel, Luana Jimenes, Marcia de Oliveira, Paula Sassi, Priscilla Herreiras.

16.9.06

Grupo Carmina - Teatro Brincante - 15/09/06

Sinatra está resfriado

“Sinatra resfriado é Picasso sem tinta, Ferrari sem combustível – só que pior. Porque um resfriado comum despoja Sinatra de uma jóia que não dá para pôr no seguro – a voz dele -, mina as bases de sua confiança...”.

Gay Talese falava de Sinatra, o homem conhecido como A Voz. Havia marcado com seu empresário uma entrevista há mais de um mês, mas, ao chegar para conversar com o cantor, obteve a negativa: Sinatra está resfriado. Pensou no porque daquilo tudo: “Porque não quer falar comigo só por causa de uma gripe?” A resposta que obteve foi simples: a gripe despojava Sinatra de seu único bem verdadeiro, sua voz.

Heloísa Petri (Lolô), soprano do grupo Carmina, teve um problema. Quando estava em casa engasgou e ficou alguns segundos sem ar. Sua voz, único patrimônio, teve algumas avarias temporárias, como arranhões na garganta. Cantaria no mesmo dia, lançamento do cd Na trilha do novo mundo.

E assim a apresentação começou.

Imagine-se num mundo medieval, no meio do povo, cantando e dançando alegremente na rua. A viagem do cd consiste exatamente neste caminho. Depois de cantar com amigos, a viagem te leva para um quarto, onde as tristezas e agruras da vida aparecem. Te leva para lugares que podem ser tanto imaginados visualmente, como sentidos. Viagem da alma e viagem dos olhos.

O público, que lotou o Teatro Brincante (aquele do Antônio Nóbrega), adorava. A maioria era de músicos e amigos, e comentavam sobre os aspectos musicais da apresentação. - Gostei do agudo. Ela vai cantar na ópera, você viu?

Quando, a certa altura, Picasso ficou sem tinta. Lolô parou toda a apresentação e dirigiu-se para perto do público. “Desculpe, gente, mas acho que vamos ter de parar por aqui”. Ficamos na platéia todos atônitos. “Acontece o seguinte: eu estou completamente rouca, e estou estragando a festa. Nós fizemos um cd tão bonito, eu não quero que fiquem com a impressão errada dele, desculpem”. A voz de Lolô estava bela. É bela. Mas a cantora sentia que algo estava errado.

Na platéia, aquela platéia de especialistas, ninguém entendia. Gritos de apoio e elogios à cantora ecoavam, e todos pediam que voltasse. Mas Lolô não poderia voltar. A cantora, professora de canto há anos, sabe bem os cuidados básicos com a sua voz. Forçá-la, naquela situação, seria suicídio.

Então, voltou e sentou em sua cadeira, querendo chorar. O resto da banda, desconcertado, começou a tocar a música Bendito, e depois mais uma ou duas instrumentais. Acabou por aí.

A apresentação foi realmente boa, o cd vendeu bastante e as taças de champagne pós show eram esvaziadas e preenchidas constantemente. Conversas leves sobre política ou futebol podiam ser ouvidas no hall do belo teatro. Picasso reavera suas tintas.

Custos
R$ 2,80 – café e sanduíche
R$ 2,00 – ida e volta de ônibus com bilhete único de estudante
Total – R$ 4,80

Nota - 8

Grupo
Ana Cristina Rossetto e Marília Macedo - Flautas doces e krummhorner
Abel Vargas - Viola da Gamba
Gisela Nogueira - Viola de Arame
Terezinha Saghaard - Cravo e krummhorner
Dalga Larrondo - Percussão
Heloísa Petri e Mauro Wrona - Canto

15.9.06

Fernanda Porto - Fnac Paulista - 15/09/06

Meus dez mil corações a mil


De antenas ligadas do Sudeste.
Da frente do prédio da FIESP

Não diria da frente, mas de bem perto do prédio da FIESP, dava pra ver todos eles enfileirados. Eram mais de 200 fãs aguardando ansiosos, do lado de fora da FNAC, o show da cantora, compositora e multi-instrumentalista Fernanda Porto. Infelizmente, apenas aqueles de antenas mais ligadas ficaram sabendo da distribuição, às 18h, das 100 senhas de entrada. Então, com casa cheia, caixa na cintura e baquetas nas mãos, Fernanda iniciou um animado Baque Virado.

Eu já te conhecia

Desde o começo dos anos 90, com muitas mudanças no estilo de lá pra cá, a artista se apresenta nos palcos das principais capitais do Brasil. Já passou também por Inglaterra, de onde vem seu característico drum n`bass, pela Itália, EUA e outros lugares, sempre deixando admiradores. “Vou te levar pra Bahia!” grita cheia de sotaque uma delas, em meio a aplausos e assobios. Fernanda sorri. “Vocês me acostumam mal”.

Nem se atreva a me dizer do que é feito o samba

MPB, samba-reggae, Bossa Nova, Drum`n Bass, Maracatu, samba, canto lírico, pop, rock. Fernanda samba assim. É ela mesma quem cria os arranjos no computador, usando recursos de tecnologia musical aliados à gravação de instrumentos acústicos. Durante o show, além de tocar caixa, violão, sax e guitarra, ela também foi a responsável por introduzir os samplers de seu novo cd a cada música. Uma infinidade de sons que encheram o ambiente, tornando o ‘show de bolso’ muito mais grandioso do que se poderia imaginar.

Na pista todo mundo brilha

Formado basicamente por jovens, o público se solta devagar. Começam tímidos, mais ou menos imitando a moça que dança em cima de altas plataformas no palco, e aos poucos se sentem à vontade para bater palmas mais forte nos intervalos e até gritar alguns “Você é linda” e “Ae! Caixeira!”. São convidados a cantar junto músicas de maior sucesso como Só tinha de ser com você, Roda Viva e Giramundo. A cantora troca sorrisos com uma menina que gira os dedos indicadores para o alto. É mesmo muito simpática.

Meus dez mil corações a mil

O show veio para lançar o terceiro CD e o novo DVD da artista: Fernanda Porto ao Vivo. Além das músicas citadas ao longo do texto, a nova produção também inclui Coco Sem Água, 1999, Você e Eu, Saudade Do Que Não Tive, Pensamento 4 (participação de Edgard Scandurra), Sampa (remixado) e muitas outras. Fica evidente que não está mais no palco somente a ‘voz brasileira do drum n`bass’. É uma Fernanda Porto evoluída, mais ousada e menos tímida. Diferente dos primeiros CDs, ela agora não se esconde atrás de um milhão de instrumentos (são só mil!). Conta com a ajuda do sorridente David Rangel, no baixo, e da impressionante Christianne Neves, nos teclados, tamborim, cavaquinho, meia-lua e agogô. Ao final, Fernanda vai para o camarim e reaparece, minutos depois, pronta para a sessão de autógrafos. Sou a primeira! Saio de lá contente: com toda a energia de uma mulher incrível e “mil beijos” num pedaço de papel.

Set List – 1.Baque Virado – 2.Eu já te conhecia – 3.Coco sem água – 4.Simples – 5.Só tinha de ser com você – 6.1999 – 7.Você e eu – 8.Samba a dois – 9.Saudades do que não tive – 10.Pensamento 4 – 11.Sampa – 12.Seu nome na areia – 13.Tudo de bom – 14.Roda Viva – 15.Giramundo – 16.Corações a mil

Nota - 9,5

Custos
R$ 0,00 (fui e voltei a pé)
Matéria por Gaia Gonçalves
Fotos Por Fernanda Almeida Silva

13.9.06

Deuses Gregos - FAAP - 13/09/06

Mito e Realidade, Arte e História

Quarta-Feira à tarde e o Museu de Arte Brasileira da FAAP lotado de excursões escolares, idosos e jovens que foram até lá conferir a já tão comentada exposição do acervo de arte greco-romana do Museu Pergamon de Berlim.

A mostra “Deuses Gregos” é divida entre as salas do museu de acordo com seus eixos temáticos. A primeira parte exibe estátuas de mármore dos deuses mais conhecidos do panteão grego: Hermes, Dionísio, Atenas, Afrodite, Zeus. As estátuas impressionam tanto pela perfeição das formas, quanto pela sua boa conservação – tendo em vista que foram esculpidas no período Helenístico (últimos séculos na cronologia antes de Cristo).

Passei depois para o salão que mais me emocionou durante toda a exposição: o Teatro Grego. Reproduções em mármore das máscaras usadas no teatro, estátuas de atores e uma imagem que sempre se repete, Dionísio. O deus da festa, do vinho e das bacantes.

Antes de passar para a outra ala do museu, reparei em um painel meio escondido que comparava o politeísmo grego e as crenças nos orixás. Não resisti, tive que ler. A comparação é feita na medida em que tanto os deuses gregos, como os orixás são entidades que regem não só a natureza, como também aspectos importantes da vida social e do comportamento humano, em seus respectivos contextos, é claro. A diferença maior entre eles se dá na forma de contato com esses deuses; os orixás “baixam” nos médiuns, aproximando-se assim das pessoas, os deuses gregos se aproximam através da arte. As tão belas estátuas não são à toa, são o modo de se aproximar, de cultuar e de venerar os deuses do Olimpo.

Do outro lado do museu, há uma réplica de jardim romano. Fontes, espelhos d’água, plantas e claro, estatuetas e peças de decoração da época. Seguindo em frente, há uma parte dedicada somente às festas, ritos, danças, e novamente Dionísio muito bem representado. Foi nessa parte que os vasos gregos, presentes em toda a mostra, me chamaram mais a atenção. Muitíssimo bem preservados, os vasos impressionam pela técnica, mas também pela beleza dos desenhos neles gravados, contando os mitos e os deuses dessa civilização.

A última sessão é uma “reconstituição” do altar de Pergamon, que dá nome ao museu de onde a mostra foi retirada. Aqui é notada uma preocupação arqueológica, de não só preservar os vestígios e ruínas dos templos, mas de reconstituir também o caráter pomposo e o status-quo dos templos e dos adoradores dos deuses, para que o observador contemporâneo realmente consiga perceber e se aproximar do local que visita e de seu contexto histórico.

Quando se vai numa exposição cujo tema é Grécia antiga, ou mesmo ao estudar o tema, é difícil perceber a diferença entre realidade e mito, entre história e arte; essas instâncias se confundem. E é exatamente isso que imprime esse caráter único e encantador à exposição, fazendo-a ser tão fascinante.

Custos - 2 reais (ônibus para ir e voltar)
Nota - 10

(Imagens de Divulgação)