25.7.06

Exposição Shoko (Caminho) - Espaço Cultural Citigroup - 21/07/06

A alma feminina em cerâmica

“Queria fazer coisas belas que fossem eternas,
com a energia natural da terra e com a força do calor,
num caminho que não tivesse fim”

Há tempos estava para visitar a exposição de cerâmicas da artista japonesa Shoko Suzuki. Aproveitei uma tarde de segunda-feira tranqüila e fui até o Espaço Cultural Citibank, na Avenida Paulista.

A serenidade é o primeiro impacto no contato com as obras de Shoko. A mansidão com que cada uma das peças foi moldada, as nuances suaves das cores da terra, as cores cruas e as tonalidades cinzas amenizam o olhar.

As primeiras obras expostas logo na entrada datam da década de cinqüenta, quando a artista ainda morava no Japão. São vasos menores, bem trabalhados, demonstram a feminilidade e sensualidade de Shoko. Vê-se claramente a mulher amadurecendo e transbordando para a arte.

“O contato com o ritmo do forno é importante
para captar melhor o ambiente que se forma.
O movimento do forno se integra
ao movimento natural do meu corpo.
Sua suavidade ajuda na minha expressão.
O silêncio e a solidão são parte disso.”

Na década de sessenta, já no Brasil, a artista mantém as cores tradicionais, mas com formatos diferentes, mais arrojados. Em algumas obras, Shoko deixa a tinta escorrer sobre as peças. Parece que, de alguma forma, quer fazer os objetos sangrarem, quer que eles rompam a tradição.

E se na década de sessenta ela quis romper a tradição, na de setenta conseguiu. Os sangramentos, antes pequenos escorrimentos de tinta pelo vaso, viraram borrões. Além disso, bocais entortados e fendas na superfície dos objetos começam a aparecer. A cada década, os bocais diminuem. Como se cada vez mais a passagem se estreitasse.

Seguindo para o próximo decênio, vemos claramente a estruturação de todas as mudanças e tendências dos períodos anteriores. O borrão é a única parte da obra que carrega as cores pacatas dos tons de terra de antes. O resto do vaso tem agora cores fortes, como o roxo. Cicatrizes, lembrando feridas na pele, aparecem. Uma técnica que neste período é bastante usada é a de fazer pequenos círculos redondos emparelhados. A impressão é a de uma pele enrugada.

Através dos vasos, Shoko vai dando indicativas de si, de como a arte abre feridas em sua vida e de como o amadurecimento e mudanças na vida vão modificando seu trabalho. Afinal, quando há tamanha proximidade entre arte e artista, as barreiras que separam um e outro já não podem ser delineadas.

“A queima (quando a cerâmica entra no forno)
é um momento de oração que leva à elevação espiritual.”

Nos anos noventa as cicatrizes viraram flor, as cores tradicionais voltaram, andando lado a lado com tonalidades novas, como a de cor laranja. É a junção das inovações todas com a as velhas tradições.

A parte que mais impressiona, porém, ainda estava por vir. Pela primeira vez, não são vasos os objetos expostos, mas sim pratos. Feita em 2000, a instalação intitulada Andando pelo Cosmos (figura ao lado) é fora do comum. Quando li o título, perguntei a mim mesmo: “como uma pessoa quer caminhar pelo cosmos com pratos?”. A resposta estava ali, era só ver.

A maneira como dispôs as figuras negras nos pratos nos remete à nossa própria recolocação no universo. Nossas diversas formas de tentar achar um lugar no mundo, e entrar em contato com nossos vários eus. Um jeito de caminhar pelas estrelas nos permitindo usar como trampolim as viagens desta artista japonesa, considerada a melhor do país neste tipo de arte.

“Para mim, o movimento da queima tem de ser silencioso,
sem palavras para que se crie o ambiente necessário.
A queima é a mais solitária possível,
o fogo me leva uma coisa sagrada
e o Forno é o meio para chegar,
e também instrumento para que as peças saiam.”

Custos –
nada (fui e voltei a pé)

Nota – 10

Curadoria – Julio Abe Wakahara, Ivone Shirahata,
Lilá Papenburg, Neide Caldas
Vieira, Sonia Bogaz

Exposição Shoko – Caminho
Espaço Cultural Citigroup – Avenida Paulista, 1.111

(Imagens feitas por Claudia Piccazio com exclusividade para o ARTE FREE)

2 comentários:

Helô Louzada disse...

adorei !! mesmo !!!

Anônimo disse...

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